3.8.09

A noite atlântica

Só quem viveu sabe o que foi. E quem viveu de forma intensa as noites dos Dias Atlânticos não deixou de estar presente nesta festa. Vieram um pouco de todo o lado, sem hesitações e com o apelo forte de um chamamento. Foram em vasto número aqueles que não conseguiram resistir ao charme viciante da recordação das melhores noites de sempre por terras do litoral alentejano.

A maioria dos mais assíduos antigos clientes chegaram cedo como se quisessem confirmar que existia mesmo uma festa e que não estariam a sonhar. “Belisquem-me para ter a certeza de que é verdade” era uma expressão que se sentia em muitos dos olhares daqueles que já lá estavam quando entrei. Cheguei cedo. Nem era meia-noite quando abordei o parque de estacionamento dos Dias Atlânticos. Os carros começavam a acumular-se e, depois de uns instantes de hesitação, optei por fazer tudo como antigamente. Perdi mais uns minutos que custaram a passar e deixei a viatura perto da casa de um amigo meu. Na generalidade, as pessoas começaram a chegar à discoteca bastante cedo. O facto de terem existido diversos jantares de grupo fez com que muita gente preferisse ir directa do restaurante para a celebração.

Os reencontros com amigos foram uma constante e a noite só teve o defeito de não se ter esticado mais horas, mais dias, mais noites. Logo à entrada, alguns colegas do liceu e um abraço ao antigo porteiro Velez, com quem recordei algumas histórias no meio de largos sorrisos. Pouco depois, e ainda fora da discoteca, foi a vez de um grande abraço a Luís Lucas, meu grande amigo de muitas noites nos Dias e de várias tardes, no estúdio da Miróbriga, na condução do programa “Café Rock”. Falámos das festas, das coberturas em directo pela rádio… até que um calafrio me percorreu a espinha quando o Lucas me perguntou pelo saudoso Fernando Calado.

Finalmente, entrei na discoteca. Parei para duas conversas com Zé Dado e Paulo Chaves, enquanto a casa começava a encher. Fui abordado por uma antiga cliente dos Dias que visitara o meu blogue. Entre palavras repletas de simpatia passámos em revista as noites que marcaram o início dos anos 90 na nossa região. Entretanto, sou abraçado por outro antigo colega de secundária. Na cabine dos DJ’s estavam Zé Alexandre, Luís Sambado e Miguel Fino. Mais tarde, vi Tiago Rito, um dos homens que fundou os Dias Atlânticos, certamente agradado com a adesão popular.

Consegui percorrer uns dois metros no espaço de meia-hora. Nada mau porque ainda me mexia com grande à-vontade e era simples pedir uma bebida. Em má hora não o fiz porque, em breve, estaria uns 30 minutos numa afável espera para ser atendido. Os preços eram simpáticos e o consumo mínimo exigido também era acessível.

A casa esteve apinhada, o ambiente foi fantástico, a música – após um início com 3 ou 4 músicas que me fizeram tremer (nunca fui fã de ABBA) – avançou, rapidamente, para a coerência e qualidade a que estávamos habituados. Além dos êxitos de massas, por lá passaram coisas tão boas como “E=MC2” dos Big Audio Dynamite (a banda de Mick Jones dos Clash) que me fizeram dar uns passos mais largos de dança numa pista forçosamente pequena para tanta gente. Tal como Miguel Camanho (DJ de tantas e tão boas noites em Sines) me dizia numa das dezenas de reencontros que tive, “isto são músicas que já só escutamos ou em casa ou no carro”, numa alusão às opções musicais que os bares e discotecas vão teimando em manter. Curiosamente, as músicas do “pum-pum” não são muito consideradas nem valorizadas pela população que responde aos rigorosos estudos realizados pelas grandes cadeias de rádio. Ou seja, e a menos que a população que é aleatoriamente contactada para colaborar nos estudos de opinião seja diametralmente oposta aos clientes dos estabelecimentos de diversão nocturna, alguma coisa permanece uma gigantesca incógnita no que concerne às músicas que passam nestes locais. Enfim, ontem, tivemos, nos antigos Dias Atlânticos, uma noite em cheio e com uma animação de louvar.

Os anos passam e nada permanece igual. O local é o mesmo, mas muita coisa sucedeu desde que os Dias Atlânticos fecharam as portas. O recinto já conheceu épocas mais gloriosas e mais condizentes com a sua história. A organização da festa fez o que pôde para minorar alguma natural decadência. As colunas foram alugadas. As luzes eram sofríveis. Porém, quem faz o sucesso de uma festa são as pessoas. E aquelas pessoas estavam-se nas tintas para o acessório. O importante era a emoção e o sentimento que as rodeava. O balanço da noite revivalista que decorreu nos Dias Atlânticos só pode resumir-se a uma palavra: sucesso.

Já não estava com o Lucas há muitos anos e, durante a noite, foi possível irmos recordando aspectos e histórias dos tempos dos Dias Atlânticos. Num momento em que estávamos a olhar para o ambiente que se vivia, Lucas comentava que os Dias tinham sido uma discoteca marcante. De facto, somente uma discoteca que tivesse marcado uma geração poderia reunir tanta gente. Reencontros à parte, também tive oportunidade de conhecer pessoas novas que eram antigos clientes dos Dias, incluindo, Carmen Botelho, que em boa hora concebeu o cartaz/convite da iniciativa.

Após um sucesso como este, toda a gente aguarda para ver o que se seguirá. Dentro do formato “Dias Atlânticos”, muita coisa pode fazer sentido, porém, em matéria de revivalismo puro e duro, uma ou duas festas por ano já seria muito bom.

Esta foi uma rara e magnífica noite atlântica.








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