19.9.06

O nosso fado é azul

Nós podemos escolher quase tudo nesta vida. Porém, o clube de futebol da nossa preferência é uma opção do coração. No meu caso, sou simpatizante confesso do Belenenses, tendo "herdado" esta paixão de meu pai - adepto azul dos tempos em que o clube era realmente grande e em que lutava para ser campeão. Que saudades deve ele ter de jogadores como Matateu ou Di Pace...
Deixo aqui reproduzida uma crónica minha em que apresento uma primeira aproximação do que defendo para o futuro do tradicional Belém. Este texto foi escrito num destes dias e canalizado para o excelente blogue azul CFBelenenses.

Em jeito de introdução, quero deixá-lo descansado. Esta crónica não se dirige a si. Estou, sim, pensando consigo e analisando todos os outros que, normalmente, participam nos comentários e com os quais o meu amigo discorda.

Como é público e notório participo em blogues azuis há muito pouco tempo e devo dizer, antes de ser acusado de "bota-abaixo" ou de outra coisa qualquer menos simpática, que louvo estes espaços, pois, são muito positivos em face da causa azul que (os) nos move. Porém, quem entre pela primeira vez e faça umas leituras dos comentários inseridos terá a tentação de dividir a maioria dos participantes em quatro grandes classes: aqueles que já foram dirigentes, os que são dirigentes, os que o ambicionam ser e os adeptos puros. A estes quatro tipos de comentadores seria possível acrescentar, ainda, a subclasse barulhenta dos agitadores, que se movem pelo amor ao clube, mesmo que esse sentimento não seja canalizado por ondas neuronais compreensíveis para quem só agora chegou.

Os novatos são assim. Gostam de colocar etiquetas e de dividir em grupos tudo o que desconhecem para que seja possível analisar as coisas e chegar a conclusões. De uma forma mais simples, poderia cometer o sacrilégio de dividir a maioria dos comentadores em dois únicos tipos, aqueles que defendem a gestão actual e os outros que atiram com a direcção para a lama. A fronteira para sarar estas diferenças seria o titulo nacional, mas esse anda arredado há "escassos" 60 anos. Enfim, não devemos desesperar porque somos todos do Belenenses e, também, dignos representantes da pátria de Camões.

Utópico é esperar que todos pensem de igual modo. É bom que pensemos de formas diferentes, ainda que o objectivo seja comum. Contudo, só conseguiremos recolher dividendos das diferenças no dia em todas elas sejam canalizadas para o Belenenses, independentemente de quem dirige ou de quem treina ou joga. Qualquer um de nós sabe que os resultados da equipa de futebol sénior têm piorado ao longo das décadas. Igualmente, estamos conscientes de que o clube tem perdido adeptos e influência. Porém, também sabemos que o Belém possui dimensão nacional, não se resumindo a uma "coisa de bairro". Como diria Carlos do Carmo, em Lisboa já temos Sporting e Benfica, o que torna extremamente complicado fazer singrar um terceiro clube no futebol. Todos entendemos a necessidade de crescer, de nos modernizarmos, de enfrentarmos os problemas de frente e de elaborarmos um projecto com cabeça, tronco e membros. Estes raciocínios são minimamente consensuais e não geram grandes discordâncias porque, no limite, todos queremos ver o Belenenses campeão.

Continuando sem dizer novidade alguma, para que o sucesso seja alcançado precisaremos de reunir um binómio de excelência: equipa directiva e projecto.

Falando de forma abstracta, vamos começar pela equipa directiva. Ao contrário do que muitos escrevem, não creio que seja necessário encontrar um Super-Homem para Presidente. Nem é necessário nenhum génio mediático. Quando Pinto da Costa chegou a presidente do FCP também não era nenhuma figura pública conceituada nem sequer tinha o dom da palavra.
Necessitamos, somente, de alguém sério, competente, incorruptível, que defenda o nosso interesse com "unhas e dentes" e que descubra o segundo segredo para o sucesso, ou seja, que saiba rodear-se de uma equipa multidisciplinar, habilitada, coesa, ambiciosa e profissional.
Inteligentemente, Pinto da Costa aproveitou o embalo de Pedroto, analisou o "mercado" e descobriu o meio de atingir os seus fins. Fez-se acompanhar de um discurso mediático contra o centro do poder no futebol, que era Lisboa. Soube utilizar a "guerra" Norte-Sul de maneira brilhante, transformando um clube de bairro num clube de expressão nacional. No presente, é fácil descortinar o ponto sensível do futebol português e que se chama (falta de) transparência. Quem saiba usar esse discurso mediático e se faça acompanhar de uma estratégia inteligente, irá ter exposição e possibilidade de crescimento. O futebol português cheira mal e prevê-se que este pântano bafiento não dure muito mais tempo. A geração dos actuais e velhos dirigentes está à beira do colapso e a sua substituição será inevitável. Por artes da classificação inacreditável da época passada, o "caso Mateus" colocou-nos na primeira linha dessa luta pela credibilização do futebol lusitano e projectou Cabral Ferreira como representante de uma nova vaga de dirigentes do nosso futebol.

Na vertente do projecto que devemos edificar para o Belenenses, teremos de ser realistas e pragmáticos. Se os outros caçam com cão, nós teremos de ser imaginativos o suficiente para caçarmos com gato. Como sabemos, em qualquer organização existem sempre opiniões e visões contraditórias. Umas ganham e outras perdem. É a vida. Sem entrar no detalhe básico do departamento de futebol ideal (com olheiros e prospecção de novos talentos, camadas jovens, etc.) ou no pormenor de onde deva ficar uma piscina ou um pavilhão, vou exercer o meu próprio direito ao palpite, rumo ao que considero essencial para o sucesso. Poderia elencar cinquenta pontos de relevância difusa, mas, na minha óptica, bastam cinco estruturantes:
- Serviços administrativos profissionalizados, com captação de associados em campanhas de marketing bem delineadas;
- Envolvimento de todos os sócios e simpatizantes, incluindo as organizações colectivas, tais como, filiais, núcleos e claques, num projecto global de colaboração activa com o Clube - dentro da capacidade e disponibilidade de cada um;
- Parcerias com grupos económicos lideres de mercado em Portugal, com entrada, na SAD, de capitais nacionais ou estrangeiros de topo;
- Construção de um Centro de Estágios ou Complexo Desportivo no vizinho concelho de Oeiras em articulação com a Câmara Municipal;
- Projecto imobiliário de grande envergadura que inclua Centro de Escritórios e Centro Comercial de luxo (as Amoreiras do século XXI), gerando considerável receita fixa mensal.

Com a concretização destes dois últimos pontos (Centro de Estágios e Projecto Imobiliário), o Belenenses estaria preparado para todas as conquistas que sonhamos.
Ao longo das últimas décadas, temos mantido um ciclo descendente, perdendo-nos em guerras internas visíveis até nestes blogues azuis e que só dão força a Velhos do Restelo.
O destino pode ser azul, desde que saibamos aproveitar o presente com a mesma ambição de quem partiu de Belém em fantásticas naus e caravelas.
Nós, "Os Belenenses" do século XXI, poderemos retomar caminhos passados com a vontade e a determinação que nos transforma no único clube português capaz de se intrometer entre Benfica, Sporting e Porto.
Estamos à espera do quê para construirmos o futuro?
O nosso fado tem de ser azul.


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