17.9.08

John Watts é e não é Fischer-Z

John Watts quando quer é os Fischer-Z. Quando está a apresentar-se como John Watts é apenas John Watts. Como os dois projectos são encarnados pela mesma pessoa torna-se sempre confuso conseguir saber a que espectáculo se vai assistir. Confuso para nós portugueses porque não existe qualquer dúvida de que a actividade dos Fischer-Z está suspensa desde há alguns anos. No sábado passado, na Amadora, esteve “apenas” John Watts e a sua banda. O concerto foi constituído, esmagadoramente, por músicas novas ainda não editadas. Houve tempo para “Marliese” (o single mais vendido dos Fischer-Z) e para “So Long” (o tema que as rádios das playlists transformaram no maior clássico), além de uma abertura com “The Worker” (o primeiro single de sucesso). De resto, além de outra canção do primeiro álbum dos Fischer-Z, nem sequer o minúsculo “Luton to Lisbon” foi escutado.

Analisar o concerto não é tarefa simples. Porque o público que queria ver Fischer-Z foi levado ao engano por notícias como a publicada num jornal diário e que anunciava:
“A noite conta ainda com o cantautor britânico John Watts, que revisita 25 anos de carreira, na companhia dos Fischer-Z”.
Naturalmente que não houve nenhuma revisitação e nem baixista esteve presente em palco. Unicamente, teclas, guitarra, bateria e voz. Por outro lado, o som da guitarra foi acústico e até o baixo do “So Long” saiu do teclado...

John Watts não actuava em Portugal há bastante tempo e a brincadeira na festa dos 25 da “Febre de Sábado” não passou disso mesmo. Quem nesse concerto esperou pelos Fischer-Z ficou claramente desiludido. Muita gente se recorda ainda dessa desilusão como constatei por observações realizadas por espectadores na Amadora…
Na verdade, os Fischer-Z conseguiram atingir, em Portugal, um patamar elevado de popularidade entre 1979 e 1981. Os seus primeiros três álbuns, “Word Salad” (79), “Going Deaf for a Living” (80) e “Red Skies Over Paradise” (81), foram sucesso por terras lusitanas, tendo culminado no famoso concerto no Estádio de Alvalade, integrado na gigantesca festa do programa “Febre de sábado de manhã”.

Tirando um concerto de menor dimensão, na sequência da edição do CD “Kamikaze Shirt” (93), os Fischer-Z não regressaram mais a solo nacional. Desde então, passaram 15 anos e John Watts tem conseguido manter um peculiar culto em torno de si. As raríssimas edições discográficas que chegam até nós também ajudam a fortalecer esse culto, pois, para o comum dos portugueses, John Watts gravou meia dúzia de discos e retirou-se algures na década de 80, depois de ter lançado qualquer coisa a solo.

Longe de ter estado parado, ao longo destes anos, Watts foi editando álbuns atrás de álbuns, uns em nome dos Fischer-Z, outros enquanto J.M.Watts, Watts ou John Watts. Como se vê, mesmo o trabalho a solo tem conhecido diferentes denominações, o que contribui para este sentimento de nada ter andado a fazer nos últimos 20 anos.

Regressando ao espectáculo na Amadora. Parece-nos que, quando um artista não actua num país faz tanto tempo, devia ter o cuidado de adaptar o seu alinhamento à realidade da ocasião. Que ele não gosta de viver no passado e que prefere olhar sempre para diante já o sabíamos pela conversa que tivemos em 2006. Todavia, a inclusão de mais 3 ou 4 temas dos Fischer-Z seria absolutamente justificável e teria sido desejável - assim como outras canções gravadas a solo ou da fase desconhecida dos Fischer-Z.

Não quer isto dizer que o concerto tenha sido mau ou que o público tenha ficado manifestamente desiludido. Na verdade, sucedeu exactamente o inverso daquilo se seria normal. Mesmo temas absolutamente desconhecidos tiveram direito a uma adesão popular que nos encheu de surpresa. Algumas dessas canções, num registo mais pop, podem mesmo vir a ser fortes comercialmente. Diga-se a este propósito, que temas comercialmente fortes que permanecem desconhecidos sempre foram uma constante na carreira do John Watts. “Jukebox” ou “Destination Paradise” (Fischer-Z), “Brilliant Career” (J.M.Watts) e “Walking The Doberman” (Watts) são músicas de sucesso em qualquer rádio neste planeta, mas, alguém as conhece? Poderia continuar a referir mais uma dúzia como “Over”, “Delight”, “Just Hang On”, “Jesus Give Me Back My Life”, “Human Beings”, “Tightrope”, “Caruso”, “Marguerite Yourcenar” ou “The Perfect Day”.

Mesmo num mercado discográfico em crise, seria interessante disponibilizar um disco com o outro lado da carreira de John Watts. Pelo que assisti na Amadora parece-me que os portugueses estariam receptivos a descobrirem, afinal, o que andou este músico a produzir durante tantos e tantos anos.

Em jeito de despedida, devo dizer que preferia ter estado num concerto eléctrico de Fischer-Z, porém, isto não invalida que tenha gostado bastante de assistir a este espectáculo, mesmo em frente ao palco, com um público fantástico que apoiou os músicos do início ao fim. Foi também motivo de satisfação acompanhar o concerto lado-a-lado com David Ferreira e com Pedro Brinca - ficou quebrada a tradição de encontrar o Pedro, unicamente, nas Noites Ritual.

Espero rever John Watts em breve.



A TVAmadora mostra como foram os concertos. Clicar aqui.






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